Na segunda-feira (09/06), Secretaria de Patrimônio da
União (SPU), em reunião pública na Câmara Legislativa, apresentou aos moradores
e produtores rurais de Vicente Pires os estudos realizados por uma comissão
ligada ao órgão para a demarcação da área conhecida como Fazenda Brejo ou
Torto.
Sem a demarcação da área não há como avançar na
regularização. A chefe da SPU, Cassandra Maroni, o estudo realizado será
enviado à Justiça para reconhecimento e, posteriormente, ao GDF para que inicie
o processo de regularização dos terrenos.
Ela explicou que a área possui 1,8 hectares e é de
propriedade da União, desde que foi desapropriada em 1959.
No entanto, há muitas polêmicas na área e disputas
na Justiça.
Relembrando - Em 2013, o Ministério Público Federal
pediu à Justiça a condenação de sete pessoas envolvidas na demarcação ilegal de
áreas pertencentes a União. Entre as pessoas denunciadas pela Operação
Perímetro está a ex-superintendente da SPU, Lúcia Helena Chagas, e o
ex-presidente da Terracap, José Humberto Matias, além de servidores públicos,
acusados de emitir relatório de demarcação fraudulento forjado para beneficiar
interesses privados.
Este ano, denúncia criminal e ação de improbidade
foram ajuizadas pelo Ministério Público Federal.
Entenda o caso – (matéria publicada no site da Procuradoria da República - www.jfdf.jus.br
)
De acordo com as
apurações, a ação criminosa teve início em 2008, quando a SPU, sob o comando de
Lúcia Helena, instituiu uma comissão de demarcação para definir espaço
desapropriado em 1955 com o objetivo de construir a capital Brasília. A área
delimitada fica na fazenda Brejo ou Torto, em Vicente Pires, região com grande
potencial econômico e atraente para empreendimentos imobiliários, razão pela
qual seria repassada a uma construtora.
O grupo foi composto
por João Macedo Prado, presidente, Avelino Caixeta Nascentes e Robson Geraldo
Guiscem. Ao medir o imóvel, a comissão utilizou referências divergentes das
praticadas décadas atrás e concluiu que a área seria de 2.152 hectares, e não
1.807 hectares já aferidos. Diante dos fatos, recomendou que o excedente
encontrado – cerca de 344 hectares – fosse devolvido aos herdeiros de Eduardo
D’utra Vaz, um dos antigos donos da gleba.
Provas e depoimentos
colhidos na Operação Perímetro, entretanto, apontaram diversas irregularidades
na perícia técnica realizada pela SPU. “De acordo com a Polícia Federal, ao
invés de selecionar o marco ‘G’ como coordenada para a demarcação do terreno, a
equipe indevidamente escolheu o marco ‘F’, encontrando uma sobra que sugeriu
pertencer a particulares”, esclarece laudo do Instituto Nacional de
Criminalística (INC).
Essa avaliação, lembra
o MPF, foi apresentada à 14ª Vara Federal de São Paulo que, levada a erro,
determinou a alteração da matrícula da terra, desmembrando-a em duas, após
incessante apelo de Lúcia Helena. Antes da manifestação da Justiça, o tabelião
Carlos Eduardo Ferraz de Matos Barroso expediu várias Notas de Devolução em que
negou o registro da área.
De acordo com o INC, os
indícios de fraude são reforçados porque nenhum dos membros da comissão era
credenciado junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
(Incra), condição indispensável para produzir memoriais descritivos, conforme
determina a Lei de Registros Públicos.
Ainda em depoimento à
Polícia Federal, alguns integrantes da comissão declararam ter apenas assinado
o relatório final, transformando a demarcação em nítida peça de ficção, como
define o MPF.
A comissão contou,
ainda, com a participação de um profissional estranho à administração pública.
“Cláudio Thomé, que nunca trabalhou na SPU, fazia os mapas e colocava o nome de
dois ou três servidores da secretaria e o timbre da União”, detalha o
Ministério Público.
Outro denunciado pelo
MPF é Roldiney Roy Rodrigues, proprietário de um trecho da fazenda Brejo ou
Torto e à época presidente da Cooperativa Habitacional Cooperville. Ele pagou
cerca de R$ 35 mil a Cláudio Thomé pelo georreferenciamento do imóvel e
confecção indevida dos documentos.
Falsidade
e outros crimes - José
Humberto Matias de Paula também concorreu para a prática dos delitos ao
autorizar a doação ilegal de uma área da Terracap à União. O pedido de
transferência partiu de Lúcia Helena, sob o pretexto de ser implementada a
Floresta Nacional de Brasília. Antes disso, porém, ela havia afirmado ao Juízo
Federal de São Paulo que a União não tinha interesse no remanescente de terra.
“Faixas de terras de
propriedade da Terracap e da empresa Valência Participações Ltda. foram
mensuradas como da União, assim gerando o pseudo-remanescente que
posteriormente foi sugerido (e defendido pela própria SPU/DF) ser de
titularidade do espólio de Eduardo D’utra Vaz, o qual já recebeu dezenas de
milhões de reais da Brookfield Incorporações S.A. por parceria imobiliária no
local”, acentuam os procuradores.
O MPF considerou que
todos os denunciados participaram de associação criminosa. João Prado, Avelino
Nascentes, Robson Guiscem e Cláudio Thomé são acusados de falsa perícia por
afirmarem que o perímetro do terreno tinha 2.152 hectares, metragem não
comprovada em laudos técnicos oficiais. Lúcia Helena também colaborou com a
fraude, já que era responsável pela supervisão e aprovação do relatório.
O crime de corrupção
ativa de perito é atribuído a Roldiney Rodrigues pelo pagamento de R$ 35 mil ao
arquiteto e técnico em agrimensura Cláudio Thomé. A mãe de Roldiney, Luzia
Rodrigues de Souza, tinha, inclusive, firmado contrato com a empresa Brookfield
Incorporações S.A., e recebido quase R$ 7 milhões por futuros empreendimentos
na região.
Contra Lúcia Helena e
José Humberto de Paula, o MPF pede a condenação por falsidade ideológica pelas
declarações inverídicas com o fim de ocultar a sobreposição de terrenos. Lúcia
Helena ainda responde pelo crime de advocacia administrativa qualificada, assim
como João Prado, já que defendiam interesse privado ilegítimo perante a
Administração Pública, valendo-se de seus cargos públicos.
Entre as infrações que
sustentam a ação por improbidade, o MPF/DF aponta que os membros da comissão,
ao permitirem a incorporação de bens da União e do Distrito Federal por
particulares, contribuíram para danos aos cofres públicos, enriquecimento
ilícito de terceiros e violação de princípios da Administração Pública, como
honestidade, imparcialidade e finalidade pública do ato.
Para conter os efeitos
da demarcação fraudulenta, o desembargador José Lunardelli, do Tribunal
Regional Federal da 3ª Região, determinou, em tutela antecipada, a suspensão
das matrículas 154.305 e 327.485, geradas pela decisão da 14ª Vara Federal de
São Paulo. A medida já foi cumprida pelo Cartório do 3º Registro de Imóveis no
Distrito Federal.
A SPU/DF também adotou
procedimentos internos para coibir a permanência das irregularidades.
Constituiu nova Comissão Demarcatória, com outros servidores, e exonerou em
julho passado Lúcia Helena e João Prado dos cargos que ocupavam na secretaria.